sábado, 2 de junho de 2012

INSIDE




Sempre tive o fascínio das JANELAS. São elas os olhos das casas e é por detrás delas que está a alma. Esta, como qualquer alma, não se vê, adivinha-se, imagina-se...Aqui há dias, porém, aconteceu-me o contrário.
Na rua, nem reparei nas janelas (que me lembre era apenas uma porta alta, forte, escura). Quando dei por mim estava dentro da alma, dentro da casa, da “casa dos espíritos”. Cada um deles tinha uma história, cada canto, cada peça, cada partícula de pó, átomo ou célula tinha uma alma.

Realidade ou ficção, os fantasmas por lá andavam, desde o século XVIII até hoje, para onde haviam de ir se aquela é a sua casa? 


Uma “casa com vida própria”, como nos disse o seu atual proprietário. E assim que ele proferiu a frase, o tule transparente dos fantasmas começou nova dança do ventre e o relógio do tempo girou à volta de três séculos de estórias.



Foram os pés dos homens pisando a uva, os tonéis a encherem-se de tinto espumoso a par das vozes dos cantadores até à alvorada.

 Foi o homem do capote que chegou e bebeu mais um copo, aquecendo as mãos no bafo do frio que das paredes e pipas escorria…

Lá fora, na despensa, as mulheres na azáfama. Os cestos prontos para a ronda, o cantil à espera da fonte, o piquenique à espera do cante, os pardais na sua gritaria no limoeiro.



Lá em cima, na cozinha, os bolos crescem nas formas, e o dono da casa, outrora com cinco anos, espera para rapar o fundo do tacho, na mesma cadeira outrora do pai, do avô, bisavô outrora.



 Na sala do fundo passa-se a ferro, uma voz canta, podia ser soprano, podia ser o piano, o vento dispersa o som, as vozes, os pardais. Os fantasmas adormecem, os santos velam pelos vivos e pelos mortos.

   Algures no Alentejo. Uma casa de vidraças viradas para dentro, uma casa de terraço virada para fora.




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