quarta-feira, 30 de abril de 2014

Cantigas de abril


Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
O povo é quem mais ordena
Dentro de ti, ó cidade
Dentro de ti, ó cidade
O povo é quem mais ordena
Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada esquina, um amigo
Em cada rosto, igualdade
Grândola, vila morena
Terra da fraternidade







Nos anos 80, quando estudava em Coimbra, ia passar o feriado à “terra”, onde, à meia-noite do dia 24, os foguetes riscavam o céu e se cantava a plenos pulmões “Grândola vila morena”. A tradição manteve-se até agora, 20 anos depois, 40 depois do 25 de Abril, mesmo depois da CDU ter perdido a Câmara para o PS e novamente agora que a recuperou. À meia-noite interrompe-se o concerto, seja ele qual for, canta-se Grândola e os foguetes disparam.
Desta vez, 40 anos depois do 25 de Abril, e mais de vinte depois de ter estudado em terras do Mondego, estava em Coimbra. Enquanto em Évora se ouviriam foguetes e a Grândola do Zeca, em Coimbra era o silêncio total. Enquanto estudante creio que nem uma só vez lá passei o dia da liberdade, portanto, desconhecia que ali, numa cidade que sempre considerei revolucionária, céus e vozes se confinassem ao silêncio. E ali estávamos nós, pais e filhos (os meus filhos nasceram depois do 25 de Abril, mas sempre cantaram a Grândola e os foguetes), na ponte pedonal do Parque verde sobre o Mondego, olhando os céus e ouvindo apenas rumores de bares. Se queríamos ouvir a música do Zeca só havia uma hipótese: rumar para dentro da casinha e ouvi-la num qualquer canal televisivo: e foi o que fizemos , ouvindo apenas metade, na RTP 2.


Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada rosto, igualdade
O povo é quem mais ordena
À sombra duma azinheira
Que já não sabia a idade
Jurei ter por companheira
Grândola, a tua vontade
Grândola a tua vontade
Jurei ter por companheira
À sombra duma azinheira
Que já não sabia a idade











A segunda hipótese de a ouvir e cantar em coro, ocorreu mais de 24 horas depois, no Teatro Gil Vicente, onde em “25 cantigas de Abril” lá se cantou a Grândola completa, à meia noite e vinte, de dia 26 ! Do cardápio, outras músicas do Zeca se cantaram, e foi com revivalismo e nostalgia dos tempos de estudante que revi e ouvi o Orfeón de Coimbra. Lá no fundo do palco eram outras caras, mas tal como naqueles filmes em que o passado se infiltra no presente, eu olhava aqueles caras jovens de bocas ovais de sopranos, contraltos e baixos e via perfeitamente as caras de outros tempos, como se fosse ainda hoje…

Outras nostalgias lá fui revivendo. Na manhã especial do 25 de Abril, a Rua Ferreira Borges, Praça 8 de maio e do Comércio enfeitaram-se de trajes e produtos regionais e as montras decoraram-se com motivos alusivos à data (ver fotos anteriores).







E, no meio, de várias atuações, destacou-se novamente o Orfeon Académico numa performance conjunta com os grupos de Teatro da Associação de Estudantes, TEUC e CITAC. Entre os atores simulando a morte , simulando a vitória para todo o sempre da liberdade, lá estava eu, pequenina, alentejana e descalça, no filme que misturava passado e presente …







Mas Coimbra de agora não é a Coimbra da juventude. A magia já não está lá, os anos passaram, as cores são outras e Coimbra, também ela , envelheceu (ou seria sempre assim e eu não via na altura?) Coimbra converteu-se à religião dos centros comerciais, deixando morrer a sua baixa e baixinha, que se veem agora completamente ao abandono. Onde estão, por exemplo,  os cinemas nas zonas centrais que lhe conferiam movimento e vida? Mais uma vez nos centros comerciais… Coimbra não é definitivamente a mesma, é uma aldeia de ruas a subir e a descer, de ruas a precisar de limpeza, de fachadas a estalar de velhas, de abandono, tudo quase a ruir. Não, não fui só eu que envelheci…



(esta é uma fachada arranjada, apesar da conversa anterior...)

Felizmente que da outra margem, outrora com silvas e mato, o rio se abriu para o desporto naútico, piqueniques, passeios, fitness.. . Desse lado, como já outras vezez referi, Coimbra lavou a cara e encanta …





Com mais sol encantaria certamente, o que não aconteceu… mas mesmo sem ele o colourun realizou-se e os rostos iam alegres.


Valeu a pena, já dizia Pessoa “tudo vale a pena se a alma não é pequena”, sobretudo quando toca a passear com a família e amigos.

Para rematar , um salto à Praia da Claridade onde o sol já dava o ar de sua graça no dia de regresso, pois então…




segunda-feira, 21 de abril de 2014

A porta abriu-se

Afinal lá saíram estes viajantesdecasaascostas por uma fresta da porta. Uma fresta pequena de duas noites, por caminhos há muito conhecidos, vezes sem conta fotografados mas ainda assim uma rapidinha na qual deu para   VER:

Azul

Mar
Pessoas aos sol
Pessoas na água
Barcos no horizonte

Autocaravanas 












CHEIRAR:

Mar
Peixe
Sol e vento

TOCAR:

Na areia da praia


SABOREAR:
O primeiro gelado da primavera, na praça Marquês de Pombal




Mudanças:

Coisa rara destes viajantes: por via das contingências ainda embruxadas de 2012, “fechámo-nos” no parque de campismo de Porto Côvo, mesmo ao lado da zona para autocaravanas; esta  a custo zero,  a outra nem por isso. Nada de novo na área. Continua concorrida, gente a pernoitar, a estar, a esvaziar e a encher depósitos de águas.
Igualmente nada de novo no parque de campismo que não serve, decididamente, para o espírito livre e aventureiro de quem procura e quer sempre mais.  É um bairro de bungallows e roulottes nas suas quintinhas privadas, com mais ou menos jardins, mesas, candeeiros e bibelots. No bairro não há espaço para tendas quanto mais para autocaravanas, só muros, arbustos, antenas. Valha-lhe a zona de churrascos coletiva e talvez, no verão, a piscina. Deste modo como querem eles que as AC se confinem a parques? Só porque não sabem mesmo o que é ser autocaravanista.


(parque de campismo de Porto Covo)

Sendo nós dos raros (ainda lá vimos mais 3) a ficar no camping, todas as outras respiravam outro ar mais livre, como na falésia, o sítio das nossas preferências por estas bandas, onde, com a consciência tranquila gostamos de ficar a ver o mar, ali onde se é rei da paisagem. Como nós outros lá estavam, discretamente. Passámos lá uma tarde a VER e em família, com coisas de família.

 (atenção : estas não são as nossas casas!)


Avizinha-se, porém, um mau verão para os amantes de Porto Côvo. A praia da Samoqueira vê-se reduzida a calhau e a rochas.

(Samoqueira)


Salvou-se a Praia Grande e a dos Buizinhos que, apesar de micro, as suas águas reluzem de brilho e tons de azul, valendo-lhe ainda ser a mais próxima da vila.

                                                                        (Praia Grande)




                                                                          (Buizinhos)

Em S. Torpes o mesmo cenário de pouca areia e muito calhau, ficando a praia reduzida a metade do comprimento e em zona balnear, onde em 2014 espaço para estender a toalha?




quinta-feira, 17 de abril de 2014

A porta fechou-se






A porta tem estado praticamente fechada, daí não me encontrarem por mais que batam, não que tenha saído, eu estou cá, mas não se esqueçam que me costumavam encontrar na rua, a vadiar sobre rodas...

“… a noite anterior fora véspera de Todos-os-Santos, uma época perigosa durante a qual os espíritos maléficos vagueavam à solta” (Ken Follett) . 
Encontrei esta frase num romance que ocorre em plena Idade Média, e pareceu-me adequada às minhas mais recentes vivências, desde o dia 1 novembro de 2012.
Desde aí muitos espíritos maléficos têm andado por aqui à solta…

Com a porta tantas vezes fechada à estrada sobre rodas, limito-me hoje, a presentear-vos com algumas palavras e imagens de quem viaja cá dentro (da santa terrinha, é claro). 







As portas e as janelas são desta cidade alentejana, branca e ocre, que, anos volvidos à espera de novas demãos, se vê finalmente a recomeçar brilhando, alvo de nova pintura e limpeza por parte da nova equipa camarária. Muito ainda falta fazer, como se pode notar, as paredes são muitas, a vontade também, as mãos vamos lá ver se chegam , já para não falar da tinta , porque o homem da “cal branca” que dantes se ouvia apregoar não sei se volta mais…


Passeando intramuros, não seria um passeio fidedigno à terra se não se reparasse na toponímia em feitio de gema ocre estatelada em fundo branco cal alentejano. Umas vezes a relembrar pessoas, outras o  quotidiano, e sempre a História.







A história nas ruas com e sem Catedral ao fundo, a História nas pedras que vieram dos romanos, a pedra histórica de um templo que é romano e que todos chamam de Diana e é de todos nós e não dela, a história das janelas de tempos idos e de quem lá mora ainda.














A história mais ou menos recente de quem sabe misturar ervas e cheiros e pão e fazer História de paladares , como este que dizem ser especial,



 embora para os nativos outras tabernas mais humildes em preço se destaquem, como esta, não propriamente uma taberna , mas ainda assim bem típica, onde se come o melhor arroz de tamboril alguma vez inventado.

É verdade, mesmo sem mar, em plena planície, onde a azeitona o pão e o vinho constituem prato, entrada e a base de uma boa mesa.

Para doces ainda resiste aos ventos e marés a pastelaria Violeta, a sua antiguidade comprova-se no circunflexo a teimar proteger o “e” do sol.



O som das andorinhas não se ouve aqui, mas pelas ruas de telhas cozidas é o que não falta, a Primavera chegou, o verde chama-nos ao descanso, as esplanadas começam a apetecer antes que chegue a época do braseiro (mais conhecida por Calor de Verão com mais de 40º)…. Só para quem cá vive, aqui, em Évora, sempre, faça sol faça frio, há pouco ou muito tempo.